sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Kook Chiado (Chiado)

Ouvi falar, pela primeira vez, no Kook Chiado à cerca de duas semanas, quando saiu um pequeno artigo sobre a sua equipa e o seu conceito. A equipa parecia-me interessante e com passagens por sítios de renome na cidade de Lisboa, mas o conceito assustava-me um pouco. Sushi e petiscos portugueses no mesmo espaço? Já tive más experiências com restaurantes que ambicionam agradar a um público alvo vasto, ou encaixar-se nas modas, e depois falham miseravelmente.
Mas a possibilidade de fazer o passatempo de aniversário do blog num espaço recentemente aberto, com boa pinta e com uma carta que, apesar do anteriormente mencionado, até parece apelativa, era irrecusável. E não poderia lançar um passatempo sobre um restaurante sem primeiro vos dar a minha opinião sobre o mesmo não é?


Ao entrarmos no restaurante ficamos agradados com a decoração. É um restaurante moderno, decorado com bom gosto e recebemos logo o primeiro sorriso da noite. Ao longo de toda a refeição, todo o atendimento foi (quase) exemplar, mas sempre bastante simpático e prestável. Tão prestável que, enquanto nos colocávamos nas mãos do chef David Costa, não colocando qualquer restrição aos pratos com que ele nos quisesse presentear, estávamos bastante indecisos sobre o que beber, ao que nos foi sugerido uma Sakerinha de Maracujá. Fresca, quase um sumo, não se notando muito o álcool e servido com os caroços do maracujá, e isso para mim é um ponto a favor. É como as mousses de maracujá, se não tiver sementes não tem metade da piada.


Assim que chega o Couvert, senti as minhas expectativas subir, apenas pela forma cuidada como é apresentado. Uma base com dois tipos de pães (e dois exemplares de cada) quentinhos a libertar um aroma que nos mete a boca a salivar. A manteiga de ovelha cremosa, quase com a textura de um queijo, derretendo-se assim que colocada num pedaço do fantástico pão. Também o hummus é muito bom, de boa consistência e com a adição de um qualquer ingrediente que não consegui descortinar, mas que lhe conferia uma ligeira acidez, tornando-o multidimensional. (Depois de uma rápida consulta à ementa do Kook, apercebi-me que o hummus do restaurante é feito de tremoço. Excelente ideia e concretização)
Nunca um couvert me deixou com um sorriso tão grande na cara.


Com o couvert, chega também um mini cesto de Chips de Batata-Doce Frita. Não pareciam acabadas de fritar pela temperatura a que estavam e faltava-lhes a adição de um pouco de sal, mas estavam boas e cada rodela estaladiça foi devorada até não restar nada mais no cesto.


Para entrada, o chef quis presentar-nos com uma verdadeira obra de arte, concretizada pelo sushiman Octávio Melo. Apesar de não ser das minhas piores fotos (sendo que as minhas fotos nunca são realmente boas), ela não faz justiça ao prato que nos foi colocado à frente. Sim, sushi é arte, mesmo que não tenha sido pintado por Picasso, e a forma como as peças são dispostas no prato são o cartão de visita do sushiman, pois os olhos também comem.
Variedade suficiente para nos dar a provar um pouco do que têm na carta de sushi, vou tentar descrever-vos o melhor possível aquilo que havia neste combinado de 20 peças. Aqui foi um ponto onde o serviço falhou porque não nos foi explicado (nem antes nem depois) o que nos estava a ser servido. Penso que apenas no couvert e na sobremesa isso nos foi explicado.
Sashimi de salmão, camarão e atum ligeiramente braseado. Fantástico a nível de frescura e sabor, principalmente o atum. Tem sido raro encontrar sashimi de atum desta qualidade, parecendo-me até ser um corte de uma zona mais gorda, mas não sendo barriga. Mais um ponto positivo na apresentação do sashimi de camarão, com a cauda e a cabeça do animal a ser também apresentado. Bonito, mas acima de tudo saboroso.
Nos nigiris, bom o de atum (agora já parecendo ter um tipo de atum mais magro) com um arroz acima da média mas com o formato de nigiri a ser mais alto do que o que estou habituado. O de salmão foi mais uma fantástica surpresa, pela adição de pesto no topo do peixe. Boa combinação e a funcionar bastante bem.
O (único) rolo presente tinha um nível técnico e de inovação que apreciei bastante. O Salmão braseado a fazer a vez do arroz, com atum picado no interior e um molho de kimuchi (a versão japonesa do kimchi) por cima. Excelente combinação, dando para distinguir na perfeição os dois peixes diferentes
Para completar as 20 peças, dois gunkans de salmão, com uma variedade grande de ingredientes a servir de topping, mas infelizmente não fui capaz de distinguir mais quase nenhum. Mesmo não sabendo bem o que estava a comer, a explosão de sabores que senti foi impressionante. Sabores que parecia reconhecer mas que o meu cérebro não conseguiu nomear. Muito bom.


Para nos dar a conhecer a vertente de cozinha portuguesa do Kook, chegaram à mesa dois pratos principais diferentes, tendo a empregada que colocou os pratos se enganado, porque colocou o prato de peixe a quem tinha os talheres de carne e vice-versa. Mas nada de grave.
O prato de peixe era o BaKalhau à Lagareiro, uma reinterpretação bastante fiel do nosso prato tão bem conhecido, sendo o ponto principal de diferenciação o nível da apresentação, não sendo servido uma posta grande mas três bocados. O bacalhau estava excelentemente cozinhado, a lascar bastante bem e com bom ponto de sal, apresentando ainda o pormenor da pele semi-estaladiça. Normalmente evito a pele do bacalhau porque é um pouco grossa e costuma apresentar-se com uma textura mais gelatinosa, mas esta não resisti e não sobrou nem uma amostra para levar à cozinha. Boas batatas no forno e umas folhas de espinafres salteadas completam um conjunto tão típico da nossa cozinha, neste caso elevado a uma qualidade superior à normalmente encontrada.


Porque este é um restaurante com uma temática bastante portuguesa, o prato de carne teria que ser um dos mais emblemáticos pratos de carne em Portugal, o cozido à portuguesa, aqui apelidado de Kozido Kook. E aqui nota-se claramente o cuidado na apresentação (e consequente inovação) que parece ser uma das imagens de marca do Kook. À esquerda, apresentado como numa terrina, as várias carnes colocadas em camadas. Carne de vaca, farinheira, chouriço, morcela e no fim carne de porco e sua orelha. Todas as componentes muito boas individualmente e a funcionar bem quando juntas. A orelha (algo que adoro) estava bastante cozida e até gosto dela um pouco menos cozida para dar uma textura diferente ao conjunto. Também o acompanhamento é diferente e apresentado de forma original, com os legumes cozidos (cenoura, batata-doce e batata?) a estarem enroladas em couve lombarda. Um pouco cozidos demais os legumes, tornando-se em puré já na boca, mas pouco grave na minha opinião. Diferente, novo, original e com um toque de hortelã. Tudo finalizado com o caldo do cozido que é despejado sobre o prato.
Se tivesse que dar um exemplo do que é reinterpretar um clássico, este é um exemplo perfeito. E estava de tal forma saboroso e viciante que, não só fiquei triste quando acabou o prato porque ainda queria mais, como me esqueci de verter mais caldo de tão entusiasmado que estava.


Também nas sobremesas, tivemos o prazer de receber duas diferentes para poder experimentar o máximo de coisas possível. Primeiro, uma surpresa original mas que junta vários sabores nossos conhecidos. Suspiros em cama de mousse de lima, com um granizado de mirtilos (que não era só granizado mas continha também alguns pedaços de gelatina de mirtilos). Individualmente todos os elementos a serem fantásticos, mas a sua combinação é uma coisa de outro mundo. Excelente balanço entre acidez e doce.


Mas as reinterpretações deles não se ficaram pelos pratos principais. Quando me colocaram o prato à frente (foto em baixo) senti-me intrigado, mas devo ter feito cara de parvo quando ouvi as palavras "Este é o nosso Arroz Doce". Arroz doce? Mas onde é que está o arroz? Vou tentar descrever todos os elementos como me foram descritos mas posso-me enganar algures... Arroz doce frito com leite de coco (umas pequenas bolas a fazerem lembrar arancini), mousse de leite de coco com creme de maracujá e gelado de mojito. Muita coisa? Sim, talvez um pouco demais. Individualmente tudo era fantástico. As bolas de arroz doce fritas com o arroz ainda cremoso e bastante saboroso. A mousse de coco e o creme de maracujá a funcionarem bem juntos, graças à acidez do maracujá. E o sorbet de mojito? Genial! Muito bom mesmo. O único problema? Estes elementos não funcionavam bem juntos. Uma pena porque todos eles eram excelentes.


Saio do Kook feliz. Um sorriso na cara e na mente embarcam-me o espírito para o regresso a casa, acreditando que este é um restaurante que pode dar que falar. Pena é, a uma 5ª feira, ter tido apenas 4 clientes (eu e a minha companhia incluídos) enquanto lá estive. E quando saí de lá às 21h30 ficou o restaurante vazio. Apesar de não ser um restaurante barato, achando apenas que existe um desequilíbrio nos preços dos pratos principais, parece-me que tudo o resto é justo para o que é servido. Motivo mais do que suficiente para ser merecedor de algumas visitas e poder experimentar o resto da carta.

Kook Chiado
Lisboa, Portugal
Preço Médio: < 30 €

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